quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

carta nocturna

Desiludiste-me noite. Eras a ultima que eu esperava que me desiludisse, mas mesmo assim, quando eu menos precisava que o fizesses, tu conseguiste.
Era em ti que eu encontrava o conforto. Todos os dias, desde o momento que eu acordava, a coisa que eu mais queria era que tu chegasses. Eras o meu berço, eras o meu cobertor, eras a minha almofada e eras a minha confidente. Acalmavas o meu choro, punhas-me um sorriso no rosto, quando eu esperava nunca mais ver um. Compensavas sempre a saudade que eu sentia, a dor que eu sentia, o medo que eu sentia, com uma presença muito mais forte. No fundo eras tu quem me trazia as maiores alegrias. Não havia um único dia mau, que não fosse compensado por ti, noite. Por pior que a situação se encontrasse, mais cedo ou mais tarde, tu chegavas sempre no final do dia. Eras a minha certeza.
Chegavas, então, de mansinho para eu não me assustar, e ouvias-me durante horas e horas, ate fazeres com que o sono viesse para eu poder descansar os olhos.
Quando eu acordava, já não estavas lá. Já o dia tinha aparecido. Mas não havia mal, pois eu sabia que tu chegarias. Tu nunca me falhavas, eras sem duvida o melhor do meu dia, por muito pouco tempo que durasses eras a prova que quantidade, não é qualidade.
Mas tu minha noite, desiludiste-me. Tu, nunca me falhavas e só me trazias alegrias. Mas ultimamente, o que eu mais receio é a tua chegada. À medida que cada minuto passa, e que o céu vai escurecendo um pouco mais, o meu coração torna-se gradualmente mais pequenino.
Eu ganhei-te medo, pois tu despertas o pior que há em mim. Eu ganhei-te medo pois tu despertas o medo que há em mim, despertas as piores memórias da minha vida, despertas as desilusões, os pesadelos, as lágrimas, as perdas, todo o ódio que substituiu muito do amor que eu já senti na minha vida. Tu trazes à superfície tudo aquilo que eu mais quero esquecer. Agora, não há noite que eu não pouse a cabeça no travesseiro e não pense em tudo, principalmente no medo. E eu fico sem saber o que fazer ou como reagir a tudo e quero então adormecer, mas não consigo, pois tu já nem o sono me trazes.
Diz-me noite, porque me fizeste isto? Porque me desiludiste quando eu mais precisava de ti? Eras a ultima que eu esperava que me virasse costas.
Minha noite? Volta. Eu já não sei mas o que fazer. Sinto que a cada dia que passa, eu me afundo um pouco mais. Não só no tempo, que não espera por mim, não espera que eu me recupere, mas também no medo que eu sinto. afundo-me naquilo que sou, afundo-me em mim mesma. Não sei mais para que lado me virar, só me apetece trancar-me no quarto como tantas vezes já fiz, e chorar. Chorar até me doerem os olhos, chorar até a minha respiração ficar ofegante e eu não aguentar mais, e depois deitar a cabeça no travesseiro, e dormir, na esperança de quando acordar, os meus problemas tenham desaparecido, ou pelo menos sido atenuados. Sim, é uma atitude cobarde. Sim. Eu sei. Mas sabes? Quando não tenho mais nada a que me agarrar, não há muito que eu possa fazer. Não quando tudo que eu tinha, que me valesse, partiu sem motivo ou razão aparente. Me desiludiu.
Nunca pensei vir a dizer isto, e por muito que te magoe, eu quero o dia. E não quero dormir. Não quero porque não há noite que eu não seja bombardeada com pesadelos. Não há noite que eu não me agarre a almofada, com vontade de chorar desesperadamente. Eu não me lembro de ser assim tão fraca.
Eu quero o dia, minha querida noite. Quero o dia, pois enquanto o Sol raia, eu não estou sozinha, eu não penso nestes medos, eu não sofro tanto.
Não queria que tivesse sido assim, mas não me deixaste outra opção. Tive que seguir com o dia, quando a noite me abandonou.
Espero que um dia voltes minha noite, és insubstituível, e vou estar sempre á tua espera e me dês as noites de descanso (espiritual) que eu tanto estou a precisar.
Até qualquer noite.

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